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A cilada da “Representatividade”. Ou: por uma visibilidade radical e autônoma!
Vamos pensar sobre “representatividade” x “visibilidade”? O que se entende por isso? Que visibilidade queremos?
Beijo lésbico na novela da Globo favorece as lésbicas ou não passa de mais uma forma de assimilar nossa potência revolucionária e nos tranformar em mais um nicho de mercado pacificado e dado por satisfeito?
O que significa lésbicas numa emissora como a rede Globo, que um dia antes da famosa cena do beijo lésbico na novela, estava cobrindo e propagandeando uma manifestação de direita pedindo, dentre outras coisas, o retorno da ditadura militar? Manifestação esta, por ela e por outros setores da mídia burguesa incentivada?
Sabemos que a direita e conservadores querem ver lésbicas mortas e são portanto, nosso Inimigo. Nosso país se encontra em uma facistização crescente e isso se deve muito ao papel desempenhado pela mídia reacionária, criando um clima conservador no país refletido também nas últimas eleições.
Eu pergunto, é possível fazer um movimento e políticas lésbicas desconectadas das demais realidades? Desconectada de questões como raça e classe? Lutar o heterossexismo sem sermos também anti-capitalistas, anti-racistas, anti-ecocídio, anti-imperialismo, anti-mídia, anti-Estado, é uma luta em vão, pois esses sistemas atacam também as lésbicas. Devemos empreender uma luta radical e consciente.
A mídia burguesa e os governos utilizam da luta LGBT e dão concessões token (figurativas, apenas para dizer que incluem ‘minorias’) de forma oportunista, de maneira a distrair as populações dos massacres que os poucos Machos com poder economico e militar estão promovendo no planeta. A mídia, assim como as religiões, mantêm a dominação mental das populações, garantindo sua obediência e promovendo a internalização da visão do opressor, a ponto de pessoas extremamente precarizadas defenderem o sistema que as explora e oprime. A mídia burguesa, então, promove Falsa Consciência nos oprimidos, destrói sua memória de resistência, faz aceitar a dominação e priva de informação sobre ser dominado. Anestesia a revolta e adequa ao Capital por meio do consumismo e mata a possibilidade de sublevação, de ira coletiva para derrubar tudo isso.
A Globo mostra casal de lésbicas ricas na novela das oito, mas ao mesmo tempo tá atrapalhando revolução e consciência de classe da população por meio de emitir a visão do Capital e do Estado e alienar as mentes. A mídia é também um aparato do Racismo e eu diria que é um aparato policial em si: gera intencionalmente como pede os poderosos, pânico classista na população, principalmente na pequena burguesia de classe média que vai querer proteger seus privilégios e evitar a Guerra de classes, legitimando assim a intervenção militar nas favelas e o genocídio da população negra e pobre e o sistema/tortura prisional pra tentar conter a revolução. Difama a resistência política por meio de chamar os protestos, os ataques a opressores e o ódio de classe de “Vandalismo” e “Terrorismo” para criar pânico na população para com isso, legitimar e aumentar a Repressão Política e instalar em latinoamerica coisas como a lei anti-terrorista, que limita nossas possibilidades de manifestação e organização política, aumentando a vigilância e controle. Se não fosse a Mídia Burguesa não teríamos os panelaços, a facistização crescente, e toda essa reivindicação de retorno da ditadura militar e essa perda de memória histórica.
Além disso, a mídia vai representar quem sempre representa: ricos, brancos. Lésbicas brancas, privilegiadas, magras, femininas, ricas. Não nos interessa!
A lesbiandade representada na TV é produzida pelas mãos dos machos e para os interesses da Supremacia Masculina. Logo, o interesse que subjaz essa suposta presença de lésbicas na mídia é representar a lesbiandade como diversidade sexual pacífica e acomodada na sociedade, uma mera orientação sexual tolerada, um desvio invisível, não-ameaçador aos patriarcas. Vão representar lésbicas brancas, com filhos, casadas, aceitáveis. Vão apresentar imagens de nós como devidamente assimiladas às lógicas do sistema, domesticadas e nós, na nossa carência de pertencimento, por estarmos apartadas de nossa comunidade, raízes e ancestralidade amazônica, vamos comprar essa proposta acreditamos que vamos nos encaixar na normalidade e nesse mundo heterossexual! Mas não. Queremos destruir esse mundo e construir outro!
A lesbiandade é temida porque somos uma afronta à Ordem dos Pais. Nós Lesbicas Radicais estamos orgulhosas de sermos inimigas dos Patriarcas e queremos ser uma ameaça.
A mesma mídia burguesa patriarcal comercializa os corpos das mulheres, por meio de propagandas sexistas que explora e expôe os corpos das mulheres. É uma mídia proxeneta.
Construamos uma Visibilidade que seja a Visibilidade e a Memória da nossa Resistência, que recupere e crie consciência sapatão. Consciência de sermos um projeto radical anti-patriarcado, de que não somos só sexualidade diferente, que somos uma comunidade que resiste ancestralmente.
Podemos nós mesmas criar nossas próprias representações, produzir nossa Mídia Livre autônoma. Criar, propagar nossa revolução e ideias, arte, recuperar e defender nossa Cultura.
Ser lésbica é ser uma rebelde. Façamos jus, pois, à nossa Rebeldia. Sejamos realmente sérias sobre Radicalidade e recusemos qualquer oferta, apropriação ou chantagem do Sistema que nos oprime e à outras espécies e saqueia a Planeta Mãe.
A revolução não será televisionada!
Separatista
Separatista
Caryatis Cardea, 1984
o que eu estou pensando
nunca poderá ser perdoado
homens
estão destruindo
o mundo
irão eles descobrir minha heresia?
e eles destróem
um pouco mais a cada dia
isso não será condenado
eu digo para minhas irmãs
homens
estão destruindo
o mundo
e minhas irmãs dizem
não são os homens
que fizeram isso tudo
eles não são os únicos a serem culpados
é casta e classe
é nação
é religião e raça
e eu digo
quem há criado essas coisas?
não, um é orgânico
emergindo como lava
cada coisa foi planejada cuidadosamente
e executada
executada eu digo
mutilada estuprada assassinada
envenenada drogada
enterrada viva
estuprada
e minhas irmãs dizem
gênero não é nada
é cultura e o papel das mães
a exploração do trabalho
não são os homens
e eu digo para minhas irmãs
eu sei no que eu acredito
que cada crime
tem seu perpetrador
e cada criminoso
tem sua vítima
e eu não falo de leis
escritas por homens
mas de éticas tão cósmicas
elas são feitas da mesma matéria que mantêm
o mundo
em balança
e eles
e nós
as mulheres
são violadas
a cada minuto
de cada dia
ano após ano
por séculos
e eu digo à minhas irmãs
homens estão destruindo
o mundo
e minhas irmãs dizem
coalizão androginia
unidade
todos devemos trabalhar juntos
porque
homens
alguns homens
podem ser destrutivos
mas eles podem ser curados
eles são apenas a última forma
de pequenos meninos
mal treinados
em uma cultura
cuja raíz e propósito
nós não iremos nomear
e eu digo à minhas irmãs
casta sim e classe e religião
heterossexismo e ódio sim
de gays e judeus e pessoas de cor negra
medo da natureza
animais abatidos e mantidos captivos
magia banida
e o amor
de mulheres por mulheres
abominado
e criminalizado
guerra e as armas de guerra
prisão e as ferramentas de tortura
essas coisas não serão perdoadas
linguagens obliteradas junto à suas culturas
e às vezes suas gentes
radiação e depósitos químicos
terras deixadas estéreis
mentes deixadas estéreis
a fome de milhões
um pré-requisito da Sociedade
a dominação de crianças
uma necessidade do poder
a escravidão de mulheres
um desejo profundo e primitivo
confinamento intimidação genocídio
esfomeamento estupro tortura incesto terror
dor envenenamento terror estupro
estupro
e nós gritamos na noite
e agonizamos durante o dia
quem é que tem feito essas coisas?
e eu digo à minhas irmãs
homens estão destruindo o mundo
e minhas irmãs dizem
não
há instituições
crenças e preconceitos
nós devemos lutar para eliminar
nós podemos parar suas instituições
mas nós precisamos não confrontar
justo aqueles que as construíram
e que querem elas
e que lucram com elas
e que amam elas
e reconstróem elas
reconstróem elas
e reconstróem elas sobre nossos corpos
mas não
minhas irmãs dizem
não são os
homens
não os homens
não os
homens
e eu digo
à minhas irmãs
mas é sim.
(poema publicado no livro “For Lesbians Only – A separatist anthology” de Sarah Lucia Hoagland e Julia Penelope. Tradução livre).