as questões feministas não são questões de lésbicas

texto de monique wittig, traduzido por uma companheira.

monique wittig e outras lésbicas radicais foram expulsas da revista materialista feminista francesa, questiones feministes (questões feministas). o artigo é uma crítica ao que ela entende como uma tendência heterocentrada no movimento de mulheres francês e uma brincadeira com o nome da revista.
como o scan tinha problemas, a tradução tá com lacunas. Parece-se um pouco como a ler Safo. Em breve tentaremos disponibilizar o texto na íntegra.

(pdf) As questões feministas não são questões lésbicas

pensamentos sobre lesbofobia

Lesbofobia por parte de mulheres/feministas não passa de uma forma específica de misoginia do colonizado. Afinal a lesbofobia/ódio às lésbicas é uma forma de misoginia especial, serve à heterossexualidade compulsória e a mantêm, mantêm as mulheres na linha, ligadas à classe masculina. Tudo que indica separação dos machos é atribuído às lésbicas e tudo que é relacionado a possibilidade do separatismo e ao lesbianismo é visto como demasiado radical e extremo, demasiado ameaçador pro estatus quo, pra zona de conforto. O pensamento radical lésbico é então, demonizado e as lésbicas feministas queimadas na fogueira da misoginia, porque é ‘revolução demais’, é ir longe demais… isso não é permitido pro povo colonizado que são as mulheres. O pensamento lésbico representa então uma ameaça às bases do patriarcado, a heterossexualidade, logo a lesbofobia é uma forma de misoginia e de dominação sobre as mulheres para não permitir sair do cerco da heterossexualidade compulsória e as doutrinas perpetuadoras da sua ordem.

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a palavra lésbica pro queer e pro anarquismo/lésbicas anarquistas ou queer é nojenta. todo o tempo tentando apagar essa palavra, com queer, com masculinidades femininas, com o que for no lugar, podem se chamar de tudo menos de lésbicas. Essa palavra é mal vinda em todo lugar, até mesmo dentro do ‘feminismo’. ideologias profundamente lesbofóbicas e anti-lésbicas. sempre se colocando também contra relações profundas entre duas mulheres e patologizando como se fossem ‘monogamia’, ‘dependência’ e ‘feminilidade’, ‘possessividade’. Definitivamente as pessoas precisam entender que a realidade lésbica necessita uma epistemologia, análises, próprias, não podem importar da análise das relações heterossexuais. O contexto das relações e até mesmo das violências que se dão entre lésbicas está permeada pelo contexto lesbofóbico, tudo temos que ler tendo em mente a lesbofobia, até os supostos ‘ciúmes’ (insegurança num mundo de relações instáveis, de abandono familiar, de ataques a suas relações, de ser deixadas por lesbofobia internalizada, etc), isso não é pra desresponsabilizar, mas pra poder acolher esses casos todos sem reproduzir mais violencia lesbofobica contra essas sujeitas. E definitivamente: escrachos e difamações de lésbicas por terem tido relações difíceis e conturbadas (etiquetadas por autoridades morais cristãs do ‘feminismo’ – que as vezes está mais pra um movimento pela feminilidade – como relações ‘violentas’) é pura expressão de lesbofobia e ódio à lésbicas. Sempre a lesbofobia escondida das pessoas encontra um meio de se manifestar e aí nessas situações vem a tona, as grandes vontades de jogarem pedras nas sapatões. Como se fosse fácil pra estas construir modelos saudáveis num contexto de tanto ódio e ódio internalizado.
Meu compromisso é com as lésbicas.

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também: é lesbofobia idealizar as relações e realidade lésbica, e colocá-las de forma objetificada e fetichista como ocorre no lesbianismo político. é uma lesbianidade definida e colocada para o ‘het gaze’ para o olhar heterossexual, e não definida pelas mesmas, é uma lesbianidade fora de si mesma, definida por outras. é lesbofóbico idealizar e colocar tantas expectativas na lesbianidade e depois se voltar contra lésbicas porque não foram o paraíso idílico que estava posto pelo lesbianismo político ou por sua imaginação, como abrigos da supremacia masculina. sim que são abrigos no mais das vezes, mas essa existência e esses vínculos entre lésbicas e mulheres são fortemente atacados pelo patriarcado por representar uma ameaça direta a este, então logo é esperar demais de uma comunidade que sobrevive contra mil dificuldades, seria estranho se todas lésbicas estivessem bem, se não reproduzissem violências traumáticas deixadas pelo agressor, se não tivessem suas mentes conturbadas pelo contexto de violência em que vivem.

as lésbicas tem que ser obrigadas eternamente a performar e provar pro mundo suas relações, as relações lésbicas tem que ser perfeitas, tem que simbolizar tudo de ‘lindo e fofo’, ‘cor de rosa’ que se supoe que deveria ser as relações entre ‘mulheres’. Já que mulher né, é o sonho de feminilidade, bondade e doçura, assim deviam ser as lésbicas e suas relações. Aì quando as feministas encontram sapas feias, gordas, peludas e agressivas, bravas, elas detestam! E acusam a gente de ferir o feminsimo ou a imagem da lesbianidade!
Eu não tenho que provar nada para a heterorrealidade! Nos deixem com nossos problemas! Sâo séculos de massacre estamos tentando encontrar soluções e nos curar! E aceite: sem sua ajuda! Sem mais colonizador*s!

Saudações humanas…

“Bem -vindas …………… .

Sabe, eu sou lésbica há 30 anos. Eu me assumi quando tinha 21 anos, e em uma semana faço 51.

Vocês sabem do que a comunidade lésbica precisa?

Nós precisamos de um fórum cultural. Nós precisamos de um lugar na natureza, onde possamos ir e fazer o que fazemos melhor, que é celebrar a Mãe, celebrar umas as outras, amar umas as outras, falar de nossas vaginas, falar de nosso sangue, falar de nossas crianças, falar de nossas netas/os, falar da Mãe Terra, falar sobre consciência lésbica. E nos juntarmos e usar nosso poder enquanto mulheres para avançar nossa causa e nossa jornada.

Nós estivemos tão presas nessa conversa de identidade de gênero, e quem é realmente mulher, quem pode ser mulher e quem… Sabe, nós tivemos que lutar e gastamos muito tempo pontuando/dizendo algo que não tem como ser pontuado.

Por que deveríamos considerar tanto questões sobre identidade sexual, de gênero, masculina? ..Num momento em que nossos restaurantes estão sendo fechados, as estruturas educacionais que construímos, nossas organizações,…

Isso não é progresso. Quando a cultura e a identidade lésbica estão sendo diminuídas e nós não podemos dizer que somos mulheres, nós não podemos celebrar nossos seios, nossas vaginas, nosso sangue e nós estamos sendo barradas/excluidas na mídia, nas nossas comunidades. Isso é opressão.

Então o que pessoas oprimidas fazem? Não se dá a eles essa atenção, o que fazemos é dar a nós nossa atenção, dar às nossas causas nossa atenção, dar a nossa sexualidade nossa atenção, dar nosso cuidado.. Nós estamos ficando velhas, algumas estão tendo bebês, sabe, estamos em diferentes fases da nossa vida. Somos masculinas, somos femininas, somos andróginas, somos muitas coisas, mas somos mulheres e somos lésbicas e precisamos nos juntar. Temos que perceber o tempo nesse planeta, a divindade está nos chamando, a Mãe está nos chamando, esse planeta está em perigo, está sob o patriarcado e misógina há tanto tempo que estamos programas a brigar de uma forma.. Nós não… Nós temos uma inteligência entre mulheres e lésbicas que é muito mais abrangente do que o que esse planeta tem nos oferecer nesse momento. E eu imploro a nós mulheres que nos juntemos, usemos nossa babailá, nossa bruxaria, nossa ioruba, nossa medicina ancestral. Para que nós passamos fazer por nós o que sabemos que deve ser feito. É tempo pra isso. Esta na hora de todas as mulheres que amam mulheres se juntarem e dizerem a verdade sobre quem somos. ”

pippa fleming

lobas

os olhos selvagens me olham de volta
nós sabemos de onde temos que fugir
(mas não sabemos pra onde ir)
nós uivamos para a lua
e quando a madrugada vira mar
corremos
a pata pisa o chão escuro
(meu pé também é sujo)
desejando ser peluda e quente como você
ter sangue selvagem
fundido em lua e sangue
na beira das arvóres
no fundo do mato
nos escondemos ainda achando que podemos ser livres
ainda achando que a grande deusa vai nos proteger quando eles chegarem

(monalisa lemure)

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Entendo o heterossexismo em um ambiente somente-Lésbico

Quando você está num ambiente somente-Lésbico, é muito mais fácil de se entender as Lésbicas – porque, pela primeira vez, nós estamos visíveis umas para as outras e temos mais liberdade para sermos nós mesmas. É como se colocar adiante no foco, pra fora da obscuridade de estar no pano de fundo das vidas heteros. Nós não temos que estar constantemente lutando a violência masculina e o ódio à Lésbicas das mulheres heterossexuais, então nós podemos saber mais sobre quem nós somos. No Centro Lésbico e nos encontros somente-Lésbicos em Whannganui-a-Tara, estava claro que ali haviam outras hierarquias de poder sobre nós que incluíam, mas que eram diferentes de, racismo, etnicismo, e classismo. Um monte de Lésbicas na minha comunidade nunca foram heterossexuais na vida e algumas falavam sobre isso como algo muito importante para elas, e como uma opressão. Eu estive junta com outras três Lésbicas ex-hetero para discutir o que heterossexualidade passada significava e como isso dava à nós privilégio agora que nossas amigas Lésbicas nunca-lésbicas e amantes não tinham.


Maior parte das Lésbicas ex-heteros que eu conheci de outros lugares pareciam achar essa idéia impensável, mesmo que as Lésbicas nunca-heteros estejam em todos os lados. Mas numa comunidade onde muitas Lésbicas falam sobre o privilégio hetero de mulheres, era lógico que algumas de nós aplicaria essa idéia à Lésbicas de forma a explicar nossas diferenças. Talvez Lésbicas reacionárias estrangeiras achem difícil imaginar que Lésbicas de um país que elas rebaixavam como ‘retrasados e ignorantes’ poderiam ter políticas mais Lésbicas-identificadas e radical que as suas. Depois de tudo isso, se Aotearoa significaria dizer estar tão ‘atrás’ comparado à países ‘sofisticados, altamente civilizados’ como Inglaterra e os E.U.A., você esperaria que nós tivessemos políticas podres também. Mas o oposto está mais próximo da verdade – pessoas de nações menos poderosas muitas vezes possuíam políticas mais radicais. A rabugentice sapatão e a auto-confiança são encorajadas por viver em lugares em que as coisas não são dadas todas na mão, onde temos que fazer as coisas por nós mesmas enquanto vamos adiante porque não temos auto-intitulados líderes chefiando-nos – ou qualquer uma de nós faz o trabalho porque há tão poucas de nós.
Em uma comunidade Lésbica pequena, Sapas devem confiar umas nas outras mais ainda. Lésbicas privilegiadas costumam ter menos tendência a formar panelinhas (embora isso sim aconteça). Sapas de diferentes contextos e que saíram do armário de diferentes formas tendem a misturar-se juntas mais. Isso significa que eu tive sorte de estar rodeada de muitas sempre-Lésbicas, Sapas Velhas, Butchs e nunca-heteros. Eu não 
digo que essas Lésbicas não fossem oprimidas – elas eram, mas Lésbicas ex-heteros que saíram do armário no Movimento de Libertação de Mulheres, como eu e minhas amigas, socializadas com, sido amigas de e amantes de, e trabalharam juntas dessas Sapas. A mais amante das Lésbicas de nós aprendeu sobre suas experiências Lésbicas e lutou sua opressão. Em comunidades maiores – em grandes cidades de países largamente privilegiados – esta mistura é mais difícil de ocorrer. É uma verdadeira vergonha, porque as Lésbicas ex-heteros do Movimento de Libertação das Mulheres tendem a ficar juntas, reforçando à lesbofobia umas das outras. As coisas não são perfeitas em Whanganui-a-Tara, mas eu estive chocada com as histórias que eu escutei de Lésbicas retornando a suas casas depois de estarem em Londres e outros lugares, sobre a intensa suspeita de Lésbicas feministas das Sapas não-femininas. As linhas não foram desenhadas tão rigidamente na minha comunidade de origem.

Como uma Lésbica ex-hetero que saiu do armário no Movimento de Libertação das Mulheres em 1975, meu foco, como o de muitas outras, costumava ser o de ‘ajudar outras mulheres a se assumirem lésbicas’ (inocentemente esperando que mulheres heteros o quisessem também!), e ‘lutar a opressão das mulheres’. Pelos finais de 1976, eu descobri que eu estava considerando mulheres heteros mais importantes que as Lésbicas e que meu foco deveria ser nas Lésbicas, que estavam já fora do armário e assumidas. Eu tive um crescimento e amadurecimento – o do auto-sacrifício feminino. Tudo que eu fiz desde então foi de uma Lésbica assumida para OUTRAS lésbicas. Qualquer trabalho de doação de mim mesma que eu fiz foi para outras lésbicas. Mudando o foco das mulheres heteros para as Lésbicas me levou inevitavelmente a aprender mais sobre o Heterossexismo.

Ruston in Dykes-Loving-Dykes: Dyke Separatist Politics for Lesbians Only, Battleaxe. 1990.

Trecho de uma carta de Sheila Anne, lésbica separatista norte americana

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“O separatismo lésbico é nosso desejo de amar a nós mesmas e a outras lésbicas enquanto lésbicas. É um impulso vital de sobrevivência. Ao enfocar no amor e o cuidado pela vida das lésbicas, nós criamos um mundo de criaturas amorosas, onde há espaço para um Eu e um Outro de mulher. Para criar este mundo, conscientemente escolhemos viver num processo de separação dos indivíduos, instituições e forças internalizadas que odeiam e destróem as mulheres/lésbicas e todas as outras formas de vida do planeta. Nós nos separamos desses indivíduos, instituições e forças internalizadas (as injúrias insidiosas que jogam umas contras as outras) de todas as formas possíveis. E constantemente nos desafiamos a expandir estas formas possíveis… Não há um único modo de ser uma lésbica separatista ou de viver o separatismo lésbico (…) De qualquer maneira, enquanto estamos nos separando do heteropatriarcado, com menor ou maior sucesso, em diferentes áreas de nossas vidas, o importante é lembrar que permaneceremos num processo contínuo de união com outras lésbicas, criando comunidades que atendem às nossas necessidades. É certo que, às vezes, o que buscamos é nebuloso. Nós caminhamos do que sabemos para o que desejamos, assim é mais fácil definir do que estamos nos separando para onde estamos indo (…) O separatismo cria a possibilidade e o espaço vital para pensarmos assim.(…) Lésbicas são seres muito poderosos que podem criar, neste mundo, o mundo que imaginamos”. (Boletim Um Outro Olhar, nº 16 outono de 1992, p. 25)

JULIA, QUIERO QUE SEAS FELIZ

Margarita Pisano

Desde a Instituição, a análise de gênero se legitimou e se neutralizou, despolitizando o desequilíbrio perverso – entre mulheres e homens – em que o sistema se sustém e que nos está conduzindo, vertiginosamente, em direção à desumanização. O gênero situa o feminino e o masculino em uma relação assimétrica, sem transpôr a linha crítica do desmonte de seus valores e privilégios.
Essa macrocultura não se modifica com as demandas de igualdade dentro de si mesma e/ou na exaltação das diferenças, mas responde a uma lógica de superioridades-discriminações e à cegueira do orgulho de sua história e sua cultura.
As reivindicações não geram ideias diferentes das permanentemente rejuvenescidas pela masculinidade: a igualdade, o respeito, a tolerância, a liberdade, são conceitos elaborados desde o corpo histórico homem; suas reivindicações partem de uma história legitimada, a das mulheres, não. A liberdade vivenciada por um corpo mulher, domesticado e com potencialidades reprodutivas, é radicalmente distinta a do homem.
As mulheres foram acedendo à masculinidade – como fêmeas – e isso se confunde com mudanças culturais, quando só são de costumes. Penso que a liberdade, a igualdade, inclusive o amor, são boas ideias que, envolvidas em papel de presente, se transformam nas mais eficientes para perverter o desejo de autonomia e de verdadeira liberdade de cada ser humana.
Desde o lugar político-simbólico em que me situo, não acredito nesse sistema e em sua capacidade de mudança civilizatória, ao contrário, acredito que ele é capaz de gerar cada vez mais violência, como consequência de sua lógica, encarnada em um só corpo sexuado, histórico, válido. É questão de olhar… e ver… onde estamos e o que fazemos como humanidade. A masculinidade contém a feminilidade, é uma só ideologia e construto cultural. Esse olhar é crucial para entender a macrocultura vigente desde um lugar menos enganchado e contaminado por ela.
Nessa masculinidade/feminilidade, a que pensa, faz e ordena é a masculinidade. O coletivo de homens pensou e instalou as mulheres dentro da feminilidade. No entanto, o feminino não somos as mulheres, apesar de que somente nós tenhamos a experiência submetida da feminilidade. Trata-se de uma construção social, política, econômica e emocional desde um corpo alheio. A feminilidade não tem autonomia e nem um corpo pensado-pensante, valorado desde si mesmo: obedece quem pensa e assume aberrantemente a cultura masculinista como própria.
Se entendermos o monômio simbiótico do masculino-femenino dessa maneira, não é estranho que hoje em dia ou homens queiram recuperar o que lhes parece desejável na feminilidade, criada por eles e para eles. Dessa maneira, transitam de um patriarcado forte e duro para uma masculinidade mais plena e suavizadora de suas exigências e, sobretudo, de suas responsabilidades atuais e heróicas. Eu chamo a isso “el triunfo de la masculinidad”.
Se analisarmos desde AFORA, o último filme de Almodóvar, Hable con ella (prêmio Oscar), veremos essa projeção: os homens choram, cuidam, sentem, enquanto as mulheres de descerebram, seus corpos aparecem mudos, manipuláveis e violáveis; máxima realização da masculinidade/feminilidade, como expressão de sua grande fantasia.
Reivindicar a capacidade de emocionar-se e chorar, como se fosse o feminino em um corpo homem, me parece contaminado pela contraleitura de que uma mulher inteligente, ativa e pensante tem mais desenvolvida sua parte masculina (a cabeça). Ou seja, pensar, criar e fazer política, que são coisas constitutivas do humano, estão apropriadas pela masculinidade. Portanto, a operação de desqualificação e de submetimento das mulheres já está em marcha, e é mais profunda do que aparenta, mesmo quando a masculinidade reivindique parte da feminilidade para si; desse lugar simbólico, tira e põe o que lhe convém social, política e economicamente.
A operação feita pela masculinidade patriarcal – e que continua ressignificando a masculinidade moderna – foi deixar o corpo cíclico das mulheres atrapado na simbólica natureza-animalidade, despojando-o da criatividade intelectual humana, mas enfatizando sua intuição, seu amor-entrega e emocionalidade (descerebrando-o). Em contrapartida, o corpo homem, que também é natureza, foi transformado em pensante, falante e capaz de criar símbolos e valores, instalando-o em um protegido e vantajoso orgulho.
Por isso, há muitas diferenças entre desejar parte da feminilidade desde o lugar do poder (poder escolher feminilidades) e resistir a ela desde o lugar do dominado, como o fizeram muitas mulheres durante séculos, servindo os homens e sendo a força de reposição e reserva de seu sistema cultural. Não resgato Nada da feminilidade: o chorar não é um privilégio, a comodidade do feminino, para as mulheres, esconde escravidão; para os homens, representa liberdade.