ato 8 março em SP – lésbicas radicais presentes

 

Lésbicas radicais autônomas se fizeram presentes no ato de SP segurando faixa escrito LÉSBICAS RADICAIS CONTRA O CAPITAL E O ESTADO RACISTA PATRIARCAL, fizeram uma intervenção artística por meio de se fazer presente usando máscaras e chapéis de bruxa e entoando gritos como: “Vem! caminhão! Vem para a revolução!”, “Acorda mulher! Vire sapatão! O homem é machista e ele não vai mudar não!”, “Se toda mulher virasse sapatão, seria a revolução, seria a revolução!”, “Sapatonas contra as guerras! Sapatonas contra o Capital! Sapatonas contra o Racismo, contra o Terrorismo Neoliberal!”, “Lésbica feminista! sapatona convicta!”, “Não, não! Lesbofobia não!”, “Basta já de repressão! Pela santa inquisição! Botar fogo nas igreja libertar as sapatão!”, “Sapatão não é diferença sapatão é resistência!”.

Até onde soubemos, fomos o único grupo a sofrer violência (lesbofóbica e política) dentro do próprio ato, tendo sido atacadas por militantes do próprio ato, duas de nossas companheiras sofreram agressão e fomos perseguidas e filmadas, até a ação da comissão de segurança do ato atuar e expulsar o agressor do ato e reprimir a ação dos e das (sim) demais militantes. Também sofremos assédio lesbofóbico por parte de mulheres do próprio ato, de outras organizações. Mesmo assim se queriam nos atrapalhar, não conseguiram, seguimos firme com nossa faixa marchando e visibilizando as lésbicas.

feminismo é sobre a igualdade entre mulheres

Feminismo, para mim, nunca significou a igualdade entre homens e mulheres. Significou e significa a igualdade entre Nós – tornar-se semelhante àquelas mulheres que foram para mulheres, as que viveram pela liberdade das outras, aquelas que morreram por isso; aquelas que lutaram por mulheres e sobreviveram através da força feminina; aquelas que amaram mulheres e que perceberam que, sem a consciência e a convicção de que mulheres são primárias nas vidas umas das outras, nenhuma perspectiva nos é possível. O feminismo heterorrelacional, como o humanismo heterorrelacional, obscurece a necessidade da amizade feminina como um pilar para o feminismo, bem como uma consequência dele.

– Janice Raymond, A Passion for Friends – Toward a philosophy of female affection. Tradução: Carmen de Carvalho.

Entendo o heterossexismo em um ambiente somente-Lésbico

Quando você está num ambiente somente-Lésbico, é muito mais fácil de se entender as Lésbicas – porque, pela primeira vez, nós estamos visíveis umas para as outras e temos mais liberdade para sermos nós mesmas. É como se colocar adiante no foco, pra fora da obscuridade de estar no pano de fundo das vidas heteros. Nós não temos que estar constantemente lutando a violência masculina e o ódio à Lésbicas das mulheres heterossexuais, então nós podemos saber mais sobre quem nós somos. No Centro Lésbico e nos encontros somente-Lésbicos em Whannganui-a-Tara, estava claro que ali haviam outras hierarquias de poder sobre nós que incluíam, mas que eram diferentes de, racismo, etnicismo, e classismo. Um monte de Lésbicas na minha comunidade nunca foram heterossexuais na vida e algumas falavam sobre isso como algo muito importante para elas, e como uma opressão. Eu estive junta com outras três Lésbicas ex-hetero para discutir o que heterossexualidade passada significava e como isso dava à nós privilégio agora que nossas amigas Lésbicas nunca-lésbicas e amantes não tinham.


Maior parte das Lésbicas ex-heteros que eu conheci de outros lugares pareciam achar essa idéia impensável, mesmo que as Lésbicas nunca-heteros estejam em todos os lados. Mas numa comunidade onde muitas Lésbicas falam sobre o privilégio hetero de mulheres, era lógico que algumas de nós aplicaria essa idéia à Lésbicas de forma a explicar nossas diferenças. Talvez Lésbicas reacionárias estrangeiras achem difícil imaginar que Lésbicas de um país que elas rebaixavam como ‘retrasados e ignorantes’ poderiam ter políticas mais Lésbicas-identificadas e radical que as suas. Depois de tudo isso, se Aotearoa significaria dizer estar tão ‘atrás’ comparado à países ‘sofisticados, altamente civilizados’ como Inglaterra e os E.U.A., você esperaria que nós tivessemos políticas podres também. Mas o oposto está mais próximo da verdade – pessoas de nações menos poderosas muitas vezes possuíam políticas mais radicais. A rabugentice sapatão e a auto-confiança são encorajadas por viver em lugares em que as coisas não são dadas todas na mão, onde temos que fazer as coisas por nós mesmas enquanto vamos adiante porque não temos auto-intitulados líderes chefiando-nos – ou qualquer uma de nós faz o trabalho porque há tão poucas de nós.
Em uma comunidade Lésbica pequena, Sapas devem confiar umas nas outras mais ainda. Lésbicas privilegiadas costumam ter menos tendência a formar panelinhas (embora isso sim aconteça). Sapas de diferentes contextos e que saíram do armário de diferentes formas tendem a misturar-se juntas mais. Isso significa que eu tive sorte de estar rodeada de muitas sempre-Lésbicas, Sapas Velhas, Butchs e nunca-heteros. Eu não 
digo que essas Lésbicas não fossem oprimidas – elas eram, mas Lésbicas ex-heteros que saíram do armário no Movimento de Libertação de Mulheres, como eu e minhas amigas, socializadas com, sido amigas de e amantes de, e trabalharam juntas dessas Sapas. A mais amante das Lésbicas de nós aprendeu sobre suas experiências Lésbicas e lutou sua opressão. Em comunidades maiores – em grandes cidades de países largamente privilegiados – esta mistura é mais difícil de ocorrer. É uma verdadeira vergonha, porque as Lésbicas ex-heteros do Movimento de Libertação das Mulheres tendem a ficar juntas, reforçando à lesbofobia umas das outras. As coisas não são perfeitas em Whanganui-a-Tara, mas eu estive chocada com as histórias que eu escutei de Lésbicas retornando a suas casas depois de estarem em Londres e outros lugares, sobre a intensa suspeita de Lésbicas feministas das Sapas não-femininas. As linhas não foram desenhadas tão rigidamente na minha comunidade de origem.

Como uma Lésbica ex-hetero que saiu do armário no Movimento de Libertação das Mulheres em 1975, meu foco, como o de muitas outras, costumava ser o de ‘ajudar outras mulheres a se assumirem lésbicas’ (inocentemente esperando que mulheres heteros o quisessem também!), e ‘lutar a opressão das mulheres’. Pelos finais de 1976, eu descobri que eu estava considerando mulheres heteros mais importantes que as Lésbicas e que meu foco deveria ser nas Lésbicas, que estavam já fora do armário e assumidas. Eu tive um crescimento e amadurecimento – o do auto-sacrifício feminino. Tudo que eu fiz desde então foi de uma Lésbica assumida para OUTRAS lésbicas. Qualquer trabalho de doação de mim mesma que eu fiz foi para outras lésbicas. Mudando o foco das mulheres heteros para as Lésbicas me levou inevitavelmente a aprender mais sobre o Heterossexismo.

Ruston in Dykes-Loving-Dykes: Dyke Separatist Politics for Lesbians Only, Battleaxe. 1990.

Trecho de uma carta de Sheila Anne, lésbica separatista norte americana

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“O separatismo lésbico é nosso desejo de amar a nós mesmas e a outras lésbicas enquanto lésbicas. É um impulso vital de sobrevivência. Ao enfocar no amor e o cuidado pela vida das lésbicas, nós criamos um mundo de criaturas amorosas, onde há espaço para um Eu e um Outro de mulher. Para criar este mundo, conscientemente escolhemos viver num processo de separação dos indivíduos, instituições e forças internalizadas que odeiam e destróem as mulheres/lésbicas e todas as outras formas de vida do planeta. Nós nos separamos desses indivíduos, instituições e forças internalizadas (as injúrias insidiosas que jogam umas contras as outras) de todas as formas possíveis. E constantemente nos desafiamos a expandir estas formas possíveis… Não há um único modo de ser uma lésbica separatista ou de viver o separatismo lésbico (…) De qualquer maneira, enquanto estamos nos separando do heteropatriarcado, com menor ou maior sucesso, em diferentes áreas de nossas vidas, o importante é lembrar que permaneceremos num processo contínuo de união com outras lésbicas, criando comunidades que atendem às nossas necessidades. É certo que, às vezes, o que buscamos é nebuloso. Nós caminhamos do que sabemos para o que desejamos, assim é mais fácil definir do que estamos nos separando para onde estamos indo (…) O separatismo cria a possibilidade e o espaço vital para pensarmos assim.(…) Lésbicas são seres muito poderosos que podem criar, neste mundo, o mundo que imaginamos”. (Boletim Um Outro Olhar, nº 16 outono de 1992, p. 25)

as solteiras e as lésbicas

“Qualquer ataque à solteira é inevitavelmente um ataque à lésbica. O direito das mulheres de serem lésbicas depende do nosso direito a existir fora de relacionamentos sexuais com homens. Quando as lésbicas são estigmatizadas e insultadas, então, também, todas as mulheres que vivem independentemente de um homem.”

— Sheila Jeffreys, The Spinster and her Enemies.

lesbianismo como pacto entre mulheres

Lesbianismo é… acima de tudo a prática de solidariedade fundamental entre mulheres. Toda nossa vida emocional é investida nas mulheres, para mulheres, com mulheres; nós não damos qualquer benefício para o opressor… Todas mulheres devem se tornar lésbicas, isso é, ganhar solidariedade, resistir, e não colaborar. Enquanto o lesbianismo for considerado um tipo diferente de sexualidade, enquanto “desejo” for pensado como vindo de um impulso desconhecido, a idéia de lesbianismo como escolha política será visto como inaceitável (Monique, 1980)
retirado de “The Social Construction of Lesbianism”, Celia Kitzinger. 1987.

a categoria de lesbianismo

Historiadoras lésbicas e feministas como Lilian Faderman e Caroll Smith-Rosenberg também argumentaram que uma identidade lésbica específica, baseada nas categorizações da sexologia, foi criada no final do século XIX. Elas mostraram que, antes disso, britânicas e americanas de classe média, fossem casadas ou solteiras, engajariam-se rotineiramente em amizades passionais, românticas e frequentemente duradouras entre si; o que incluía constantes expressões de um amor pleno e dormir nos braços uma da outra, no mesmo travesseiro mesmo por uma vida inteira sem que isso fosse visto como algo suspeito. Havia algumas mulheres que, entretanto, ao longo do século XIX, que se enquadrariam no que viria a ser mais tarde o modelo sexológico, algumas que até se vestiam como homens e amavam mulheres, apesar da ausência do modelo sexológico. Uma mulher, por exemplo, do coméco do sec. XIX em Yorkshire, Ann Lister, se engajou em relações sexuais entusiásticas com vizinhas, até o ponto de contrair doenças venéreas, como conta em sus diários, e realmente concebia-se como “diferente”. Mas a existência desse tipo de mulher não parece ter influenciado a inocência com a qual amigas levavam suas relações, ou a aceitabilidade social do amor entre duas mulheres. Foi o surgimento da sexologia que tornou pública e estigmatizou a categoria de “diferença sexual”.
(…) A definição de Faderman de lesbianismo não dependia de contato genital. Ela diz “o amor entre mulheres foi primariamente um fenômeno sexual unicamente na literatura masculina”.

Os críticos de Faderman a acusaram de traição, de “dessexualisar” o lesbianismo ao incluir, em sua definição, mulheres que não tiveram contato genital no passado ou tivessem contato genital pouco frequente no presente. Para aquelas que veem o lesbianismo como diferença sexual,, amigas românicas claramente não qualificam. Mas para feministas pras quais escolher e amar mulheres é a base da identidade lésbica, elas qualificam sim. A conexão genital é difícil de provar. As lésbicas, ao longo da história, vão se provar bastante poucas, e a história das lésbicas começará apenas a partir do século XIX, se o modelo sexológico for adotado. A história da heterossexualdiade nunca foi limitada à comprovação do contato genital. A heterossexualidade é uma instituição política que não começou com a sexologia em 1890. Não é apenas uma das várias diversidades sexuais. A proposta da história das lésbicas é analisar a história da resistência feminina à heterossexualidade como instituição, em vez de apenas buscar mulheres que se enquadrem numa definição surgida no século XX e baseada na sexologia.

– retirado de Sheila Jeffreys, The Lesbian Heresy

HETEROREALIDADE

Heterorrealidade é a percepção de um mundo no qual a mulher existe sempre em relação ao homem (…), descreve uma situação criada pelas heterorrelações (…) que expressam a ampla gama de comunicações afetivas,sociais, políticas, econômicas, entre homens e mulheres (…) decretadas pelos homens. (Raymond, 1986).

Janice Raymond propõe que a cosmovisão dominante podia ser descrita como “heterorrealidade”. essa perspectiva apoia a ideia de que a mulher “existe sempre em relação a um homem” e,consequentemente, que as mulheres juntas são, de fato, mulheres sozinhas.

Esra heterorrealidade é criada pelo sistema dominante de heterorrelações, que se expressa em uma ampla gama de relações sociais, políticas e econômicas estabelecidas entre homens e mulheres. Por homens.

Paradoxalmente, as mulheres são usadas como instrumento para sustentar as heterorrelações, quando na verdade a realidade é homorrelacional, isto é, são as relações masculino-masculino que de fato determinam o curso da realidade nas esferas sociais, políticas e econômicas. O resultado é que a energia das mulheres se gasta em apoio às heterorrelações.

Na lógica das heterorrelações, as únicas relações para as mulheres são as relações homem-mulher. A heterorrealidade supõe que as mulheres não se relacionam ou não deveriam relacionar-se entre si. Raymond propõe que esta é a base da necessidade de uma filosofia do afeto feminino (o projeto de seu livro, A passion for friends ). As mulheres que têm sido monopolizadas pela manutenção de relações com homens agora devem refletir sobre o que significa para as mulheres moverem-se para além da separação heterorrelacional das mulheres, através de relações ginoafetivas. As relações ginoafetivas são relações de atração, influência, e movimento mulher-mulher. A amizade entre mulheres tem sua origem com as mulheres originais, que traçam seus próprios “começos desde o mais fundo de seu Ser e outras mulheres”. A amizade feminina é um contexto em que as mulheres podem recuperar sua integridadede seus Eus desintegrados e restaurar a ordem primordial da mulher nas relações das mulheres.

O ginoafeto é um contexto no qual as mulheres podem recordar as mulheres originais.

— Janice Raymond. A passion for friends:towards a Philosophy of female affection. Boston: Beacon Press, 1986.

ginoafeto

“A criação do amor entre mulheres foi uma tarefa necessária para a própria sobrevivência do feminismo. Se as mulheres não amarem a si mesmas e a outras mulheres, então elas não terão base na qual se identificar e rejeitar atrocidades contra mulheres. Para um movimento feminista a solidariedade do oprimido foi uma base necessária para a organização. Mas o amor entre mulheres foi sempre visto como constituinte de nada mais que uma versão de mulheres da camaradagem.
Raymond inventou o termo ‘Gyn/afeição’ para descrever o amor entre mulheres que é a fundação do feminismo. Gyn/afeição ‘conota a paixão que mulheres têm por mulheres, ou seja, a experiência de profunda atração pelo profundo e vital Ser e o movimento para outra mulher vital’ (p. 7). A política feminista precisava ser ‘baseada na amizade… Assim, o significado básico de Gyn/afeição é que o afeto de mulheres move, agita e desperta a outra para o poder completo’ (p. 9). Para muitas feministas a conclusão óbvia do amor entre mulheres era o lesbianismo (Radicalésbicas 1999). Raymond explica que embora seu conceito de Gyn/afeição seja não se limite ao lesbianismo, ela não entende porque alguma mulher que ama mulheres pararia o lesbianismo.”

— Sheila Jeffreys, Unpacking Queer Politics

orgulho lésbico – andrea dworkin

Para mim, ser uma lésbica significa três coisas.
Primeiro, significa que eu amo, acalento, e respeito mulheres em minha mente, em meu coração, e em minha alma. Esse amor de mulheres é o solo no qual a minha vida é enraizada. É o solo de nossa vida comum junta. Minha vida cresce desse solo. Em outro solo, eu morreria. De todas as maneiras eu sou forte, eu sou forte por causa do poder e paixão desse amor carinhoso.
Segundo, ser uma lésbica significa para mim que existe uma paixão erótica e intimidade que vem do toque e gosto, uma selvagem, picante ternura, um suor doce e molhado, nossos seios, nossas bocas, nossas vulvas, nossos cabelos emaranhados, nossas mãos.
Eu falo aqui de uma paixão sensual tão profunda e misteriosa quanto o mar, tão forte e tranquila como a montanha, tão insistente e mutável como o vento.
Terceiro, ser uma lésbica significa para mim a memória da mãe, lembrada em meu próprio corpo, procurado, desejado, encontrado e verdadeiramente honrado. Significa a memória do útero, quando nós formávamos uma só com nossas mães, até o nascimento quando nós éramos separadas dilaceradamente. Significa uma volta àquele lugar interior, no interior dela, no interior de nós mesmas, aos tecidos e às membranas, à umidade e ao sangue.
Existe um orgulho no amor carinhoso que é nosso terreno comum, e no amor sensual, e na memória da mãe – e esse orgulho brilha tão resplandecente quanto o sol de verão ao
meio-dia. Esse orgulho não pode ser degradado. Aqueles que o degradariam estão na posição de atirar punhados de lama ao sol. Ainda ele brilha, e aqueles que arremessam lama somente sujam suas próprias mãos.
Às vezes o sol é coberto por camadas densas de nuvens negras. Uma pessoa olhando de baixo juraria que não há sol. Mas ainda o sol brilha. À noite, quando não há luz, ainda o sol brilha. Durante a chuva ou granizo ou furacão ou tornado, ainda o sol brilha.
Será que o sol se pergunta “Eu estou bem? Eu valho a pena? Existe o suficiente de mim?” Não, ele queima e brilha. Será que o sol se pergunta “O que será que a lua pensa de mim? O que Marte sente a meu respeito hoje?” Não, ele queima, ele brilha. Será que o sol se pergunta “Sou eu tão grande quanto outros sóis em outras galáxias?” Não, ele queima, ele
brilha.
Nesse país nos próximos anos, eu acredito que existirá uma terrível tempestade. Eu acho que os céus se escurecerão além de qualquer reconhecimento. Aqueles/as que caminham nas ruas as caminharão na escuridão. Aqueles/as que estão em prisões ou instituições para doentes mentais absolutamente não verão o céu, somente a escuridão fora de janelas gradeadas. Aqueles/as que estão famintos/as e em desespero absolutamente não poderão olhar. Eles/as irão ver a escuridão enquanto ela se deita no chão em frente a seus pés. Aquelas que são estupradas olharão para a escuridão como se olhassem para o rosto do estuprador. Aqueles/as que são assaltados/as e brutalizados/as por loucos irão olhar atentamente para a escuridão para discernir quem está se movendo na direção deles/as a cada momento. Será difícil de lembrar, enquanto a tempestade se enfurece, que ainda, mesmo que não consigamos ver, o sol brilha. Será difícil para lembrar que ainda, mesmo que não consigamos ver, o sol queima. Nós ainda tentaremos vê-lo e tentaremos senti-lo, e esqueceremos que ele ainda nos aquece, que se ele não estivesse lá, queimando, brilhando, essa Terra seria um lugar gélido e desolado e estéril.
Enquanto nós tivermos vida e respiração, não importa quão escura a Terra nos rodeie, o sol ainda queima, ainda brilha. Não existe hoje sem isso. Não existe amanhã sem isso. Não
existiria nenhum ontem sem isso. Essa luz está no interior de nós – constante, aquecida, e cicatrizadora. Lembrem-se disso, irmãs, nos tempos escuros que estão por vir.

[Andrea Dworkin – in Our blood]